Em resposta a mais grave crise ambiental e climática enfrentado pelo Brasil, Senado aprova regras gerais para adaptação às mudanças climáticas
Proposta de autoria da deputada Tábata Amaral é uma das iniciativas defendidas pelos parlamentares ambientalistas.
Por Humberto Azevedo
Em resposta a mais grave crise ambiental e climática, até agora, enfrentado pelo Brasil que colocou quase 90% dos municípios do Rio Grande do Sul (RS) debaixo d’água, o Senado Federal aprovou na noite desta última quarta-feira, 15 de maio, o Projeto de Lei (PL) 4129/21 que estabelece regras gerais para a adaptação às mudanças climáticas.
O PL, de autoria da deputada Tábata Amaral (PSB-SP), é uma das iniciativas defendidas pelos parlamentares ambientalistas como forma do país enfrentar as consequências causadas dentro da estrutura climática do planeta provocadas pela interferência humana, sobretudo, nos últimos dois séculos.
A ideia da propositura é fazer com que a União (governo federal), estados e municípios formulem planos de adaptação e adequação aos novos cenários climáticos, que resultarão cada vez mais em condições extremas de temperaturas, de enchentes e estiagens. O projeto prevê que o governo federal elabore um plano nacional de adaptação à mudança do clima em articulação com estados e municípios e aponta algumas diretrizes. Como foi aprovado na forma de um texto alternativo, alterando os dispostos estabelecidos pelos deputados, o projeto voltará a tramitar na Câmara dos Deputados.
A proposta foi aprovada pela manhã na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) após acordo negociado entre as lideranças governistas e da oposição um dia antes, terça-feira, 14 de maio. Assim, o projeto avançou sem grandes discussões nesta quarta, sendo aprovado de maneira simbólica.
ACELERAÇÃO DA TRANSIÇÃO ENERGÉTICA
Para o líder do governo no Senado, senador Jaques Wagner (PT-BA), que também foi o relator da matéria na CCJ e autor do substitutivo aprovado, a proposição reconhece a necessidade do país acelerar a transição energética dos combustíveis fósseis para as matérias-primas fontes de energia limpa e renovável. Antes da CCJ, a proposta foi aprovada na Comissão de Meio Ambiente (CMA) daquela “Casa da Federação”.
“Pode-se afirmar que o evento catastrófico que observamos no Rio Grande do Sul é resultado da responsabilidade compartilhada entre os maiores emissores de GEE [gases do efeito estufa] mundiais, sobretudo a partir de combustíveis fósseis, ao longo da série histórica desde o início do período industrial. Seria ingênuo acreditar que esse desastre foi causado apenas pela ação humana dentro do território brasileiro”, argumentou Wagner em seu parecer.
SEM EFEITOS PRÁTICOS
Já o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) “o projeto não traz [nenhum] efeito prático”. Segundo o filho “zero um” do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL), a proposição “é uma [mera] elaboração de diretrizes”. Ele se manifestou contrário à aprovação da proposta, mas não colocou óbice na deliberação simbólica da matéria.
“Vendo aqui a redação final, a gente entende a boa intenção da autora. Acho que não há o efeito prático que alguns estão esperando. A discussão mais profunda sobre as coisas concretas que nós podemos fazer para avançarmos nessa linha de adaptação e convivência com essas condições climáticas extremas que acontecem em alguns locais pode ficar para outro projeto”, opinou.
O QUE PREVÊ O TEXTO
Pelo projeto, as medidas de adaptação à mudança do clima serão elaboradas por órgão federal competente em articulação com as três esferas da Federação (União, estados e municípios) e os setores socioeconômicos, garantida a participação social dos mais vulneráveis aos efeitos adversos dessa mudança e dos representantes do setor privado.
Uma emenda do senador Flávio Bolsonaro, aprovada na CCJ, incluiu uma “efetiva participação do setor empresarial na formulação e implementação do plano nacional de adaptação”.
O plano e suas ações e estratégias deverão ter como base “evidências científicas, análises modeladas e previsões de cenários, considerando os relatórios científicos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês)”.
PLANOS LOCAIS
A proposta prevê que o plano nacional de adptação às mudanças climáticas deverá indicar diretrizes para a elaboração de planos estaduais e municipais, assim como estabelecer ações e programas para auxiliar os entes federados na formulação dos seus próprios documentos. Essa implementação poderá ser financiada pelo Fundo Nacional sobre Mudança do Clima. A medida foi uma das sugestões incluídas pelo relator na Comissão de Meio Ambiente (CMA), senador Alessandro Vieira (MDB-SE).
O texto alternativo, aprovado pelo Senado, também estabelece que as ações deverão ser avaliadas, monitoradas e revisadas a cada quatro anos. No projeto original, esse prazo era de cinco anos. Os planos deverão ainda ser integrados à Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (Lei 12608/12) e à Estratégia Nacional de Segurança de Infraestruturas Críticas.
“Apesar da existência de um Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima, o país carece de uma legislação que estabeleça diretrizes gerais a todos os entes da Federação para a elaboração e revisão de seus planos de adaptação, além de incentivá-los a elaborar e implementar tais planos”, apontou o senador gaúcho eleito por Sergipe ao recomendar a aprovação do texto.
DIRETRIZES
O PL 4129/21 abrange as diretrizes gerais a serem seguidas pelos órgãos do Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama) nos planos para reduzir a vulnerabilidade do país em relação à mudança do clima. O objetivo é complementar a Lei 12187/09, que estabeleceu a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC).
Entre as diretrizes gerais para o enfrentamento das mudanças climáticas estão “o enfrentamento dos efeitos atuais e esperados das alterações climáticas; a criação de instrumentos econômicos, financeiros e socioambientais que permitam a adaptação dos sistemas naturais, humanos, produtivos e de infraestrutura; e a integração entre as estratégias locais, regionais e nacionais de redução de danos e ajuste às mudanças”.
Além disso, as ações de adaptação devem estar ligadas aos planos de redução de emissão dos gases de efeito estufa. A proposta também torna obrigatório o alinhamento dessas estratégias ao Acordo de Paris sob a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, assinado em 1992.
PRIORIDADES
A proposta prioriza as áreas de infraestrutura urbana e direito à cidade e de infraestrutura nacional. Nesses campos, estão inclusos a segurança alimentar e hídrica, a saúde, a educação e estruturas de comunicações, energia, transportes e águas.
No setor agropecuário, o texto prevê estímulos à adaptação do setor ao Plano ABC, que integra a PNMC e é voltado à economia de baixa emissão de carbono na agricultura. Tais estímulos deverão envolver investimentos em pesquisa ou na implementação de práticas e tecnologias ambientalmente adequadas.