Eduardo Azeredo acompanha o então ministro da Fazenda do governo Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, em visita de campanha eleitoral quando troca a moeda antiga que circulava “Cruzeiro Real” pela nova “Real”. (Foto: arquivo pessoal)

ENTREVISTA DA SEMANA | EDUARDO AZEREDO (PSDB-MG)

“O PSDB está fazendo falta”, afirma ex-governador de Minas Gerais nos anos 90

 

Para o também ex-senador, a falta da política mineira nos últimos anos pode explicar o clima de polarização que tem levado o país e as famílias a conflitos entre as “extremadas” esquerda e direita. Ex-deputado federal e ex-prefeito de Belo Horizonte falou, ainda, da importância do Plano Real, a mais duradoura moeda brasileira do último século, que neste mês de julho completou 30 anos de existência.

 

“O Plano Real foi realmente uma revolução na realidade econômica do Brasil”

 

Por Humberto Azevedo

 

“Eu me lembro bem da dificuldade que era governar antes do Plano Real. As dificuldades que nós tínhamos e que passávamos metade do tempo só com reajustes”

 

A entrevista da semana do portal RDMNews traz neste domingo, 28 de julho, a conversa que o ex-governador de Minas Gerais nos anos 90, Eduardo Azeredo (PSDB), concedeu a nossa reportagem há algumas semanas quando fazia uma visita a vários gabinetes de deputados e senadores. A conversa, que girou em torno das comemorações dos 30 anos do Plano Real, o tucano afirmou que “o PSDB está fazendo falta” no atual cenário político brasileiro polarizado entre esquerdistas e direitistas “extremados”.

 

“Nós do PSDB nos orgulhamos muito de termos tido esse papel fundamental, que possibilitou ao partido demonstrar que era possível se ter uma posição que não de extremos”

 

Para o ex-deputado federal e ex-prefeito de Belo Horizonte, cargos que ocupou sempre no PSDB, o atual clima de polarização que se dá em polos que orbitam tanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), quanto o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL), se compreende pela falta que a política mineira nos últimos anos tem deixado de exercer.

 

“Quem nasceu depois de 94, ou até antes, não sabe o tormento que era a inflação”

 

Condenado em 2015 a 20 anos e um mês de prisão pela juíza Melissa Lage, da 9ª Vara Criminal de Belo Horizonte, por peculato e lavagem de dinheiro, Azeredo teve a condenação suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2021, que entendeu que o caso deveria ter sido julgado tão somente pela Justiça Eleitoral.

 

“Fernando Henrique foi realmente o condutor, o que montou a equipe e que conduziu, viabilizou realmente. Mas o Itamar era o presidente da República”

 

À época da decisão da Suprema Corte, Azeredo expressou nas suas redes sociais que “só Deus sabe o que” ele e sua família padeceram “com a injustiça cometida”. “O Estado de Direito prevaleceu! O STF anulou meu processo, e o caso vai para o TRE. Fim de uma série de erros e maledicências”, pontuou.

 

“O poder público ganhava muito com a inflação. O poder público era um dos beneficiários da alta inflação”

Azeredo no momento em que era encaminhado, na data de 23 de maio de 2018, por autoridades policiais para fazer o exame de corpo de delito no Instituto de Medicina Legal (IML), em Belo Horizonte, para cumprir pena ao qual tinha sido condenado em primeira e segunda instância. Ele foi solto em 2019 após a Suprema Corte decidir que penas de prisões só podem ser cumpridas após esgotados todos os recursos no devido processo legal. (Foto: Leo Fontes / Folhapress)

Virada a página da Lava Jato, Eduardo Azeredo lançou seu livro de memórias intitulado de “O X no lugar certo” em que conta sua trajetória política vivida desde os anos 80, quando se elegeu vice-prefeito da capital mineira em 1988. Na pequena entrevista, o tucano ressaltou a importância do Plano Real, a moeda brasileira mais duradoura do último século, que neste mês de julho completou 30 anos de existência.

 

“A nota é um documento que não pode ter uma assinatura, rasuras, e eu mesmo tenho comigo uma nota de 1 Real assinada pelo Fernando Henrique no dia 1º de julho de 1994” “Foi uma data histórica, sim, e nós temos que relembrar para as novas gerações entenderem o que foi o período de hiperinflação”

 

RDMNews: Esse mês de julho foram comemorados os 30 anos do Plano Real. O sr. à época estava para assumir o governo de Minas Gerais. Como gestor, qual a importância do Plano Real?

No dia 1º de julho de 1994, quando entrou em circulação a nova moeda do país, o Real, o então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, estava em Poços de Caldas, no Sul de Minas. O ministro, candidato à presidência do Brasil, foi responsável pela implantação do Plano Real, que pôs fim à hiperinflação que assolava o país e trouxe estabilidade econômica ao Brasil. Na foto, o então ministro era acompanhado por Eduardo Azeredo em compromissos eleitorais. (Foto: Arquivo da Prefeitura de Poços de Caldas-MG)

Eduardo Azeredo: O Plano Real foi uma conquista, uma revolução, na verdade. E não é você ficar tendo saudosismo, não! É você aprender com o passado. E as lembranças são muito boas. O Plano Real foi realmente uma revolução na realidade econômica do Brasil, que ao contrário do que muita gente pensa, nós tivemos períodos de inflação alta em outros momentos do Brasil também. Mas, especialmente naquele período pré-Real, os nossos números chegaram a mais de dois mil por cento ao ano. E a solução que se encontrou foi brilhante, fruto do trabalho técnico, e político também, e que nós temos que continuar aprendendo o que aconteceu antes para podermos enfrentar as novas realidades. Nós do PSDB nos orgulhamos muito de termos tido esse papel fundamental, que possibilitou ao partido demonstrar que era possível se ter uma posição que não de extremos. Nem da esquerda extremada e nem da direita extremada. Eu vejo que o Brasil ainda tem muito pela frente, mas o PSDB está fazendo falta.

 

RDMNews: E qual a importância do Plano Real para as novas gerações que não viveram àquela época de inflação superior de 2000% ao ano?

Fernando Henrique Cardoso, também candidato, percorreu diversas ruas do centro da cidade de Poços de Caldas, realizando a troca da moeda antiga, o cruzeiro real, pelo Real, na agência do Banco do Brasil. O então prefeito da cidade, Luiz Antônio Batista, recepcionou as autoridades, ao lado do ex-deputado federal Carlos Mosconi, já falecido. O evento aconteceu no saguão das Thermas Antonio Carlos, com discursos do prefeito, e dos candidatos ao governo e à presidência do Brasil. (Foto: Arquivo da Prefeitura de Poços de Caldas-MG)

Eduardo Azeredo: Eu acredito que o papel da imprensa e dos organismos parlamentares é fundamental. Porque as pessoas, realmente, não se lembram. Quem nasceu depois de 94, ou até antes, não sabe o tormento que era a inflação. Eu fui prefeito no período ainda inflacionário, prefeito de Belo Horizonte (MG), e governador no pós-Real, no primeiro momento do Real. Então, eu me lembro bem da dificuldade que era governar antes do Plano Real. As dificuldades que nós tínhamos e que passávamos metade do tempo só com reajustes, decisões de reajustes dos funcionários, reajustes de trânsito, de transporte público, e do orçamento como um todo que já começava a ter que ser suplementado. E a realidade pós-Real. É verdade que para os governantes foi até mais difícil, não com esse aspecto a que me referi – o aspecto da dificuldade do tempo, mas a dificuldade financeira. Porque o poder público ganhava muito com a inflação. O poder público era um dos beneficiários da alta inflação. E é fácil entender, a medida em que os impostos eram reajustados diariamente porque as pessoas iam pagando com preços mais altos – enquanto os gastos eram mais sob controle. Minas Gerais chegou a ter em um dos anos anteriores ao Plano Real quatro folhas de pagamento só de benefícios financeiros, de aplicação financeira. Então esse foi também um grande desafio que os governadores do pós-Real enfrentaram. Adaptar o orçamento a ausência da receita inflacionária.

 

RDMNews: À época as histórias de quem era o “pai” do Plano Real foi uma disputa densa tanto por parte do ex-presidente Itamar Franco e do então ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, que chegaram a ser desafetos. Até o Itamar, querendo retornar ao Palácio do Planalto em 1998, perdeu a indicação do PMDB que ficou neutro naquela eleição, e acabou enfrentando o sr. e tirando a sua reeleição ao governo de Minas. Depois, o tempo passou, os episódios de atritos foram superados. Mas quem é “pai” do Plano Real? Itamar ou FHC?

Com o livro de memórias em mãos, Azeredo se encaminha para uma livraria de Belo Horizonte, em janeiro de 2022, onde realizou uma sessão de autógrafos da sua obra. (Foto: arquivo pessoal)

Eduardo Azeredo: Ah! São os dois, não há dúvida. Porque o Fernando Henrique foi realmente o condutor, o que montou a equipe e que conduziu, viabilizou realmente. Mas o Itamar era o presidente da República. O Itamar tinha alguns rompantes nacionalistas, ele não concordava em não existir congelamento de preço, mas ele realmente teve a coragem de escolher o Fernando Henrique, que não era da área, e teve o apoio todo. E a minha convivência com o Itamar, ela teve só aquele momento de disputa em 98. Mas eu reconheço nele um homem público que como presidente da República teve um papel muito importante. E como senador também. Tanto que cumprimentei várias vezes e tive com ele como senador. Mas é muito importante lembrar, sim, que em 1º de julho de 1994, Fernando Henrique candidato a presidente da República, eu era candidato a governador de Minas, nós fomos juntos no Banco do Brasil de Poços de Caldas para fazer a troca da moeda. Então, nós entregamos para eles no caixa lá as notas das moedas antigas e recebemos as notas do Real. E tem até um fato interessante porque começou a se pedir as assinaturas, autógrafos do Fernando Henrique, nas notas, e ele começou a assinar algumas. Até que alguém o alertou: ‘Presidente, não pode assinar na nota. A nota é um documento que não pode ter uma assinatura, rasuras, e eu mesmo tenho comigo uma nota de 1 Real assinada pelo Fernando Henrique no dia 1º de julho de 1994. Foi uma data histórica, sim, e nós temos que relembrar para as novas gerações entenderem o que foi o período de hiperinflação no Brasil.

 

RDMNews: Agora uma última pergunta. Políticos como Itamar Franco fazem falta?

Em visita ao então ministro da Agricultura, o ex-deputado federal Marcos Montes, no final da gestão Bolsonaro, entregando um exemplar do seu livro de memórias “o X no lugar certo”. (Foto: arquivo pessoal)

Eduardo Azeredo: Olha, fazem sim. Porque é sempre uma alternativa, uma alternativa mineira, e os políticos mineiros têm a paciência. E, realmente, nós estamos vendo aí no governo Lula, nós só temos um ministro mineiro, Alexandre da Silveira, em 38 ministros. E também no governo do Bolsonaro a situação se repetiu. Era apenas um mineiro não em 38, mas em 25, 26. Agora a culpa é um pouco dos próprios mineiros, que realmente deixaram se levar, ou não se prepararam  para ter uma realidade de como nós temos hoje no Brasil. Eu me orgulho muito de ser um mineirão mesmo. Acho que é muito importante, você ser considerado ser conciliador e arrojado como Juscelino Kubitschek foi.

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