Entrevista da Semana | Julio Ramos

‘Um recorde de 112 novos mercados para o agronegócio brasileiro’

Em entrevista exclusiva ao portal RDMNews, Júlio Ramos, secretário-adjunto de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura Pecuária, Ramos afirma ainda que o governo Lula devolveu a credibilidade para a agricultura brasileira no mundo

 

Por Humberto Azevedo

“Em 2024, nós já batemos o nosso próprio recorde de 2023. Nós tivemos o melhor janeiro de todos os tempos, tivemos o melhor bimestre de todos os tempos, o melhor trimestre de todos os tempos e o melhor quadrimestre, de todos os tempos”, afirma o secretário-adjunto de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e Pecuária, Júlio Ramos, nesta entrevista exclusiva ao portal RDM News.

Júlio Ramos destaca que o cenário da agricultura brasileira lá fora é hoje completamente diferente, melhor e sem comparações do atual momento com a gestão anterior, que segundo ele isolou o país e prejudicou enormemente os negócios dos empresários do setor agropecuário nos últimos quatro anos.

Tragédia climática no RS

Durante a entrevista, o secretário-adjunto de Comércio de Relações Internacionais falou também da mais grave tragédia climática ao qual o estado do Rio Grande do Sul está passando.

“Todo mundo aqui está se empenhando ao máximo. Hoje [terça-feira, 7 de maio, data da presente entrevista] passamos a manhã inteira nos reunido com o pessoal da Farsul [Federação dos Sindicatos Rurais patronais da Agricultura], do Rio Grande do Sul. É uma situação gravíssima”, alertou. “Estamos falando no estado, que tem produção, que tem uma mão de obra importante na agricultura, então não vamos ter desabastecimento, não vamos ter como fazer chegar o alimento, então, assim, é um trabalho muito grande”, afirmou demonstrando preocupação com situação gaúcha.

Convívio com a natureza

Júlio Ramos falou ainda que os produtores rurais sabem da necessidade de conciliação com o meio ambiente e com a natureza mais do que ninguém: “O produtor sabe muito bem se não cuidarmos da questão das mudanças climáticas, de que ele planta, mas não colhe. O que temos que fazer é combater estas narrativas e mostrar ao mundo que se a gente não pensasse em melhorar a nossa produção, a nossa qualidade, com menos área. Por exemplo, o feijão. A nossa produção de feijão é igual há dez anos atrás só que num espaço, numa questão de território, 50% menor. Por quê? Por que a gente acredita nesta transformação. Quando a gente fala em floresta em pé, a gente está falando em discutir crédito de carbono para os países verem no Brasil essa possibilidade também.”

Abaixo segue a íntegra da entrevista:

RDM News – Por favor, faça uma avaliação do mercado internacional para exportações brasileiras.

Júlio Ramos – Perfeito, 2023 foi um ano de reconstrução. Foi o ano em que o Brasil voltou a dialogar com o mundo. Esse é o grande ponto. Quando o presidente Lula se elege, faz a indicação de seu ministério, inclusive, do ministro Carlos Fávaro, que começa a fazer uma série de missões internacionais que mais do que nada é construir relações, onde o Brasil esteve sempre muito bem posicionado. O Brasil sempre foi um país respeitado mundialmente, que sempre sentou à mesa para discutir diversos assuntos. E nós ficamos durante quatro anos sem ter essa representatividade. E, fora isso, não participamos de fóruns de debates internacionais. Sequer a gente era convidado. Hoje o Brasil tem posição, é convidado a participar e discutir temas nos fóruns internacionais.

“A agricultura do Brasil está cada vez mais presente na balança comercial brasileira. Quase 50% daquilo que formata a balança comercial, um quarto do PIB [Produto Interno Bruto], 20% dos empregos são provenientes da agricultura”

O Brasil pagou uma dívida de quatro anos que ficamos devendo para esses organismos internacionais. Então, nós voltamos a ter esta relação, voltamos a ter esse posicionamento. Ao longo de 2023 foram mais de 30 missões internacionais. O ministro Fávaro e o secretário Roberto Peroza [secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e Pecuária] foram como verdadeiros mascates pelo mundo e isso deu resultado. Em 2023 quebramos o recorde do saldo da balança comercial, aumentamos em R$ 7 bilhões as nossas exportações.

A agricultura do Brasil está cada vez mais presente na balança comercial brasileira. Quase 50% daquilo que formata a balança comercial, um quarto do PIB [Produto Interno Bruto], 20% dos empregos são provenientes da agricultura e mais do que isso: voltamos a abrir mercados e, ao abrir mercados, estamos falando não só em aumentar exportações, nós estamos falando em dar oportunidade para as empresas expandirem seus negócios e mais que isso, gerar emprego. Quando ela produz mais, ela está gerando mais empregos e se ela gera emprego, ela gera renda, riqueza e garante que as pessoas tenham comida na mesa, tenham acesso a educação, saúde, enfim, a outros tipos de meios que não teria.

“O ano de 2023 foi um ano de voltar, do Brasil voltou! De um reposicionamento comum com estas 78 aberturas em todos os continentes. Ásia, África, Oceania, Américas, Europa. O Brasil voltou a ter relações com o mundo”

Então, a agricultura do Brasil ao mesmo tempo em que ela ao longo dos anos se transformou, através de ciência, pesquisa, através de muito investimento, onde o peão antes ganhava R$ 1.200,00 e hoje ganha R$ 7.000,00 para pilotar uma colheitadeira.

A relação internacional do Brasil hoje é diferente. Neste ano de 2023, um ano de reconstrução, abrimos 78 novos mercados. Então, nada resiste ao trabalho! Óbvio que nós estamos falando em não ter preguiça, de querer construir essas relações. Por exemplo, nós conseguimos finalizar uma negociação de 20 anos com o México. E quando a gente fala de algodão no mundo, a gente lembra do Egito. Nós somos um dos poucos países que vendem algodão para o Egito. É o Brasil! E outros tantos produtos. Então, o ano de 2023 foi um ano de voltar, do Brasil voltou! De um reposicionamento comum com estas 78 aberturas em todos os continentes. Ásia, África, Oceania, Américas, Europa. O Brasil voltou a ter relações com o mundo.

E quando você consegue abrir o mercado, são três fatores que são incontestáveis. Primeiro, a credibilidade internacional. Segundo, o cumprimento dos requisitos sanitários – o Brasil já mostrou para o mundo que os nossos requisitos sanitários são rígidos, eficientes, por isso, os nossos produtos são de qualidade e nós somos sustentáveis. Nós temos hoje uma lei, um Código Florestal, que é um dos mais duros, mais rígidos e rigorosos do mundo. E nós temos muito orgulho disso. Nós somos exemplo para o mundo nesta questão. Vocês estão vendo as discussões na Europa hoje, que não chega nem perto daquilo que a gente faz. Então, assim, nós somos sustentáveis, nós temos qualidade dos nossos produtos com questões sanitárias e também temos confiança do mundo nestes produtos. Estamos num momento único de aumentos de oportunidades, que no fim vão gerar empregos, vão gerar renda e vão gerar desenvolvimento.

RDM News – E já há algum dado sobre aberturas de novos mercados, em 2024?

Júlio Ramos – Já. Em 2024 nós já batemos o nosso próprio recorde de 2023. Nós tivemos o melhor janeiro de todos os tempos, tivemos o melhor bimestre de todos os tempos, o melhor trimestre de todos os tempos e o melhor quadrimestre de todos os tempos. Nós já abrimos hoje [terça-feira, 7 de maio]. Nós estamos falando do mês de maio, 34 novos mercados. Devemos ter mais novidades. Mas já são 34 novos mercados. Em 2023, nós chegamos a 34 mercados em agosto e nós estamos, em maio, e maio nem começou. Então, as perspectivas são muito grandes. A gente fala que são 34 novos mercados em 2024, com 78 de 2023, que dão 112 desta nova gestão em 16 meses.

“Nós temos qualidade dos nossos produtos com questões sanitárias e também temos confiança do mundo nestes produtos. Estamos num momento único de aumentos de oportunidades, que no fim vão gerar empregos, vão gerar renda e vão gerar desenvolvimento”

RDM News – Uma crítica que se fazia no passado, isso nos anos 90, era que não adianta ter muitos mercados se esses mercados não são de intensos volumes de troca comercial. Esses novos mercados abertos de 2023 para cá são de qualidade, ou são apenas quantidade com pouco impacto na balança comercial?

Júlio Ramos – São mercados importantíssimos. E quando a gente fala de mercados importantíssimos, são mercados que o próprio setor identifica. Quando o setor, por exemplo, de proteína animal identifica uma possibilidade, ele vem nos cutuca e o Ministério faz todo um trabalho para criar essa condição para aí entrar negociações tarifárias, negociações sanitárias e negociações políticas também. Então, assim, também tem muito protecionismo entre os países. As aberturas de mercado são muito em cima, ou quase que 100%, no mínimo 90% em cima de demanda do setor privado que quer expandir. E aí tem um número legal que é assim: 70% destas aberturas são provenientes de países onde existe uma liderança agrícola. Hoje nós temos 29 adidos agrícolas nas embaixadas. O presidente Lula e o ministro Fávaro, estão no projeto de expandir estas lideranças. E querem expandir porque mostra que dá resultado. 70% destes mercados abertos, neste ano de 2023 e 2024, é porque existe um adido agrícola lá trabalhando em prol do Brasil. E é assim.

Tem muita oportunidade! Por exemplo, eu falei que abrimos o mercado do Egito e lá é um mercado de pescados, que é um mercado que movimentou meio bilhão de dólares. Nós abrimos o mercado de pescado no Egito, nas Filipinas, na África do Sul, na Austrália. Eu não falei em nenhum país pequeno. São países importantes. Abrimos também em Marrocos. Marrocos tem uma população de pet muito grande e é um mercado a ser conquistado. É muita coisa.

Conseguimos habilitar em um único dia 38 plantas frigoríficas para a China. Nunca antes na história deste país houve 38 habilitações num único dia. Nós anunciamos agora, e o ministro se pronunciou há dias atrás, 13 aberturas num único dia de abertura na Turquia. Então, é só o começo. E na Turquia, nós estivemos lá há dois meses em reuniões bilaterais. Isso é reflexo de trabalho, de confiança. O presidente Lula – nós temos sempre que ressaltar isso -, a confiabilidade do mundo perante o presidente Lula. Quando a gente chega num país e a gente fala de Brasil, as pessoas falam com muito orgulho daquilo que veem essa transformação para o Brasil.

“Hoje nós temos 29 adidos agrícolas nas embaixadas. O presidente Lula e o ministro Fávaro, estão no projeto de expandir estas lideranças. E querem expandir porque mostra que dá resultado. 70% destes mercados abertos, neste ano de 2023 e 2024, é porque existe um adido agrícola lá trabalhando em prol do Brasil”

E mais do que isso: as mudanças que o mundo vai discutir na questão da segurança alimentar, que é chegar em 2050 com 9,5 bilhões de habitantes e nós precisamos alimentar toda essa gente. A transição energética e hoje o Brasil tem o combustível mais limpo do mundo que é o etanol. E a transição da biotecnologia da bioeconomia, todas estas três passam pelo Brasil de qualquer jeito. Seja pela nossa extensão territorial, seja pela questão climática, seja pela questão de ciência e tecnologia e por aquilo que a gente já tem. Então esses temas vão precisar ser discutidos com o Brasil.

Essa questão de combate a insegurança alimentar, não é só querer vender, é poder proporcionar para um país que hoje também não tem acesso à proteína. E quando a gente faz a comparação de quanto o brasileiro come de proteína animal, quanto o europeu come e quanto o africano como, é um negócio irrisório. A gente está falando de três quilos por ano, enquanto a gente come 100, 150. Na Europa se come 80, 90. Então, assim, é levar a essas pessoas acesso a alimento de boa qualidade também.

Eu lembro que quando eu estava na Secretaria de Educação em São Paulo, em que eu era coordenador de infraestrutura, e aí apareceu um negócio lá de quererem instituir as ‘segundas-feiras sem carne’ e tal. E aí eu falei: “meu amigo, 60% dos alunos da rede pública de ensino do estado de São Paulo a única refeição do dia é dentro da escola. Eu, um reles mortal, não posso tomar uma decisão de cercear uma criança o direito a comer carne uma vez por semana. Eu não posso”. Então, é assim, quando a gente fala em segurança alimentar é dar acesso para que as pessoas tenham uma comida de qualidade na mesa. Acho que o Brasil tem esse papel.

“A gente está na expectativa de ter boas notícias para o Brasil com a China, que é o nosso maior parceiro comercial. País que a gente vendeu, em 2023, U$ 100 bilhões. É é um país importante, em que o Brasil tem boas relações, reconstruiu relações e nós vamos para lá para tentar trabalhar e voltar ao Brasil com boas notícias”

RDM News – O primeiro-ministro do Japão visitou recentemente o Brasil. Qual foi o resultado desta visita?

Júlio Ramos – O Japão é um importante parceiro comercial. Se não me falha a memória, no ano de 2023, nós exportamos quase R$ 4 bilhões. E, agora, depois do anúncio de alguns estados do Brasil livre de febre aftosa sem vacinação, a gente passa a discutir com o Japão e a Coreia do Sul poder entrar no mercado que a gente não conseguia entrar antes, que é levar proteína animal para eles – onde o Brasil hoje é o grande player do mundo.

Hoje a gente lidera seis culturas agrícolas, entre elas a carne bovina. Então essa discussão e essa conquista que o Brasil teve de um trabalho de 50 anos de erradicar a febre aftosa sem vacinação nos dá a possibilidade de discutir não só com o Japão, mas também com a Coreia, com o próprio Canadá e com países que têm essa política. Se a gente quer vender, a gente tem que se adequar a elas. E hoje nós estamos num ponto em que estamos com condições de sentar na mesa com qualquer um desses países e negociar.

Fora isso, nós temos outros assuntos que já vinham sendo discutidos e que nós vamos, agora, dia 20 de maio, para o Japão numa série de reuniões bilaterais com o governo japonês – onde vamos discutir assuntos também de fruticultura, de outras proteínas, como proteína suína. É um grande mercado, onde o Brasil sempre esteve presente e que a gente acredita que após esta visita do primeiro-ministro ao Brasil, óbvio que tem também pedidos, contrapartidas, da parte deles e esse é o mundo das boas relações. Não adianta a gente só querer vender, tem que saber comprar. A gente vai lá, fazer estas discussões e voltar com boas notícias não só para o Brasil, mas também para o Japão. Eu acredito muito nesta relação bilateral. Esse governo acredita muito nisso.

“O Brasil aprendeu a diversificar a sua produção. Hoje a gente consegue fazer três safras em determinadas regiões: safra, safrinha e safrão. Hoje a gente consegue plantar coisas que eram impensáveis. Por exemplo, produtos que a gente poderia fazer só lá na região norte, e estamos fazendo no sul e sudeste do país”

Então, nós vamos para lá, que já é um resultado desta visita do primeiro-ministro e a expectativa é muito grande. E de lá a gente segue para a China para uma das maiores feiras do mundo, em Xangai, e na sequência na Cosban em Pequim com a presença do próprio ministro Fávaro e do vice-presidente Geraldo Alckmin, onde a gente vai discutir vários assuntos, entre eles 15 pontos relacionados à agricultura. A gente está na expectativa de ter boas notícias para o Brasil com a China, que é o nosso maior parceiro comercial. País que a gente vendeu, em 2023, U$ 100 bilhões [aproximadamente R$ 516 bilhões]. É é um país importante, em que o Brasil tem boas relações, reconstruiu relações e nós vamos para lá para tentar trabalhar e voltar ao Brasil com boas notícias.

RDM News – Ainda sobre a questão da febre aftosa, quais são os estados que hoje têm selo de livre da doença sem vacinação?

Júlio Ramos – Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, alguns municípios de Mato Grosso, Rondônia e Acre e os outros em processo. Por isso se fez este pronunciamento deste anúncio. E devemos, agora, de novo. Quando a gente apresenta na Organização Mundial de Saúde Animal que o Brasil faz o protocolo em que somos livre da aftosa, sem vacinação. Então, assim, é uma marca importante para o Brasil. Nos coloca num outro patamar de discussão, num outro patamar para se discutir com países que tem isso como requisito. É como eu falei, se a gente quer vender, a gente tem que se adequar. Muitas vezes, estes pré-requisitos – não é o caso da febre aftosa, mas muitos países colocam pré-requisitos por questões protecionistas para proteger o próprio mercado interno. E se a gente quer vender e se a gente consegue se adequar, nada mais justo que a gente fazer esse trabalho.

RDM News – Mas de concreto o que saiu desta visita do primeiro-ministro do Japão ao Brasil?

Júlio Ramos – Nós vamos pleitear e, agora, como estamos livres da questão da febre aftosa sem vacinação, o acesso ao mercado de proteína, vamos discutir também pleitos que já existem junto ao Japão na questão do setor da fruticultura. Então, nós vamos tentar finalizar estas negociações, que já existem. É um mercado importantíssimo. Se a gente conseguir acessar esse mercado, não só pela relação bilateral, mas acessar pelo nosso produto de qualidade, acessar pela questão sanitária, pela questão das conformidades que o Brasil conseguiu fazer nesses anos. A gente conseguir vender para o Japão, para a Coreia do Sul, mostra o quanto o Brasil preza pela qualidade, pela eficiência.
“Nós podemos ser um grande pulmão do mundo neutralizando carbono. Porque quando a gente fala em aumentar a produção, eu preciso melhorar a estrutura logística, capacitar a mão de obra, enquanto isso eu estou desenvolvendo a cidade, as pessoas”

RDM News – E como está a situação das nossas commodities, produtos manufaturados e o acesso deles aos mais diversos mercados do mundo?

Júlio Ramos – Soja, algodão, milho. Eu acho, assim, o complexo soja sempre foi o grande limiar e destaque nas últimas balanças comerciais. O que a gente viu neste último mês foi um crescimento de outras áreas como o açúcar, café, suco de laranja e como a própria proteína – que são itens em que os preços têm melhorado. Então, assim, nós estamos num momento muito bom de diversificação.

O Brasil aprendeu a diversificar a sua produção. Hoje a gente consegue fazer três safras em determinadas regiões: safra, safrinha e safrão. Hoje a gente consegue plantar coisas que eram impensáveis. Por exemplo, produtos que a gente poderia fazer só lá na região norte, e estamos fazendo no sul e sudeste do país. Hoje a gente tem plantação de cacau no interior de São Paulo. Plantamos uva em regiões do Nordeste.

Isso mostrou que o Brasil escolheu sua vocação. Sua vocação é da agricultura e, claro, para chegar nesse lugar, é preciso investir em ciência, em pesquisa, tecnologia e aí teve o trabalho da Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária], tem os trabalhos das universidades, que se mostrou que dá para fazer mais com menos. O programa de recuperação de pastagens degradadas, que nós vamos ter oportunidade de recuperar uma área que corresponde ao tamanho da França, que são 40 milhões de hectares em áreas que hoje consomem cinco vezes mais água do que uma área normal, áreas que hoje produzem muito pouco e que poderiam produzir muito mais sem desmatar uma arvore. O Programa de recuperação de pastagens vai recuperar, por exemplo, e eu vou dar um número fácil para ser compreendido. Se pegar lá 100 hectares que se tinha 50 cabeças de gado, com essas mesmas cabeças de gado se consegue fazer em 20% destes 100 hectares. Os outros 80 hectares, se consegue fazer plantação de grãos, de florestas, produtos agroflorestais.

“Agricultura é uma ferramenta de transformação. Ela não é só o negócio que todo mundo tenta cravar como agronegócio. A agropecuária do Brasil transforma a vida das pessoas, tem impacto social para o desenvolvimento do ser humano, das cidades, da região e do país”

Ou seja, vamos integrar pecuária com lavoura, com floresta, com grãos e o que é mais incrível de tudo: nós vamos aumentar nossa produção de alimentos sem desmatar um pé de árvore. Mais do que isso: nós vamos deixar de emitir carbono para neutralizar carbono. Porque quando se transforma esta área apta, numa área produtiva, porque você tem mato, tem verde, tem produção de fotossíntese. Então, assim, o Brasil está preparado para esta transição energética, climática e a gente entende que não se tem nenhuma competição entre produzir combustível ou alimento. Nós conseguimos fazer os dois porque nós temos espaço para isso.

Hoje a produção do Brasil já é para atender um bilhão de pessoas e a gente tem a possibilidade com esse programa de dobrar essa produção de alimentos. Então, nós queremos mostrar ao mundo que nós, além de já sermos sustentáveis, nós podemos mais ainda. Nós podemos ser um grande pulmão do mundo neutralizando carbono. Porque quando a gente fala em aumentar a produção, eu preciso melhorar a estrutura logística, capacitar a mão de obra, enquanto isso eu estou desenvolvendo a cidade, as pessoas.

Então, nós estamos criando empregos e renda. Hoje o estado do Mato Grosso, por exemplo, é um dos maiores índices de desenvolvimento humano do país. Passou o Sul e o Sudeste. E é do que? Agricultura. Então, agricultura é uma ferramenta de transformação. Ela não é só o negócio que todo mundo tenta cravar como agronegócio. A agropecuária do Brasil transforma a vida das pessoas, tem impacto social para o desenvolvimento do ser humano, das cidades, da região e do país.

Então eu acho que nós estamos num nível aí muito bom para o país. Eu acho que nós conseguimos reconquistar a nossa confiança do mundo e acessar mercado que antes jamais poderíamos imaginar que a gente ia acessar. E as perspectivas são muito grandes. A gente está com muita negociação, ao mesmo tempo, e a gente está discutindo com grandes países que eu não posso falar para não atrapalhar as negociações que estão acontecendo neste momento. Então, as perspectivas são muito boas e muito otimistas.

“A gente também pode transformar essas commodities em produtos. Então, a gente acredita muito nisso. Quando o presidente Lula vislumbra uma reindustrialização, um novo momento para a indústria brasileira, primeiro, óbvio, nós estamos pensando também agregar valor aos nossos produtos”

RDM News – Como o Ministério da Agricultura está trabalhando a política de exportações com o programa de reindustrialização, chamada de Nova Indústria brasileira? Como está o processo das agroindústrias neste processo e qual a expectativa da exportação de produtos industrializados, que possuem maior valor agregado?

Júlio Ramos – Inclusive hoje [terça-feira, 7 de maio], neste horário, o ministro Fávaro está reunido com o vice-presidente Geraldo Alckmin para tratar deste programa da reindustrialização do Brasil. A gente acredita que possamos dar valor aos nossos produtos. Claro, que não vamos deixar de vender commodities. A gente também pode transformar essas commodities em produtos. Então, a gente acredita muito nisso. Quando o presidente Lula vislumbra uma reindustrialização, um novo momento para a indústria brasileira, primeiro, óbvio, nós estamos pensando também agregar valor aos nossos produtos.

Estamos tentando criar possibilidades de criar empregos qualificados. Esse é o grande papel do setor público. É criar condições para que a gente melhore as condições de vida das pessoas e geração de emprego é um destes pontos. Então, a gente vê com muito bons olhos. O nosso ministro tem atuado muito firmemente junto ao ministro e vice-presidente Geraldo Alckmin nesta área até porque a agricultura pode ser uma grande alavanca nesta reindustrialização e porque a gente acredita que o Brasil pode agregar valor à sua economia. Hoje a gente vê a China como um país que transforma. Eles são muito mais um transformador de produtos, com uma indústria de transformação, do que qualquer outra coisa. Então, se eles podem, porque a gente não pode também?

“A indústria de grãos dá essa possibilidade, o próprio café nos dá essa possibilidade, a própria transformação da laranja também nos dá essa possibilidade. De dez copos de suco de laranja no mundo, sete são oriundos destas commodities que estão no Brasil. O café, a mesma coisa”

O Brasil em 50 anos deixou de ser um importador de alimentos e passou a ser um grande exportador de alimentos. Por que não a gente ser um grande player na industrialização, produção e fabricação de produtos? Transformar e agregar valor àquilo que a gente já faz tão bem com uma agricultura sustentável, de qualidade e com preço acessível a todo mundo.

RDM News – Em quais aspectos a reindustrialização do país pode propiciar um maior giro e uma maior movimentação para a exportação das nossas agroindústrias?

Júlio Ramos – Nós temos essa condição. A indústria de grãos dá essa possibilidade, o próprio café nos dá essa possibilidade, a própria transformação da laranja também nos dá essa possibilidade. De dez copos de suco de laranja no mundo, sete são oriundos destas commodities que estão no Brasil. O café, a mesma coisa. A gente exporta café para a Alemanha para colocar dentro da cápsula, do café ‘nexpresso’, enfim. A gente exporta café para a Colômbia para fazer um mix, um bland de café, que se transforma num café colombiano. Então, o Brasil tem essa expertise.

Agora, se ele conseguir agregar valor transformando estas commodities num produto final, é maravilhoso. Não vamos tomar o lugar de ninguém. Pelo contrário! Nós vamos agregar valor e ocupar um espaço que não estamos ocupando.

“Sabe qual é a proteína mais consumida no mundo? Peixe. A gente não consegue vislumbrar isso. A gente esquece que países da Ásia consomem muito peixe. A gente não está acostumado. A gente vem de uma cultura em ascensão dentro do Brasil de acesso a peixe”

A gente fala muitas vezes, a soja, mas só tem plantação de soja, soja, soja, soja. Só que se esquece que a soja é ração animal, é leite para criança que tem intolerância à lactose e não pode com a proteína do leite de vaca, o leite de proteína animal. Eu tenho um problema em casa, eu tenho um filho que não pode nada que tenha não só a lactose – o problema dele é a proteína do leite. Então a soja não é a plantação de soja que todo mundo fala, a plantação de soja é um mix de produtos que só se consegue fazer através dela. E isso a gente só conseguiu ao longo do tempo, ao longo dos anos com muito estudo e muita pesquisa. E eu acho, que é assim, a reindustrialização nos dá a possibilidade disso de fazer mais com menos porque nós já produzimos.

RDM News – Com relação a soja, parece que tem um mito aí de que se exporta esta commodity para a China em grande maioria para ração animal. Muito do que a China compra a nossa soja é para produzir shoyu, não?

Júlio Ramos – Dos U$ 100 bilhões que a gente exporta para a China, 67%, salvo melhor juízo, ou 47%, são de soja. Nós estamos falando aí de produtos a base de soja, de alimentos. A soja te dá oportunidades inúmeras. A própria cana-de-açúcar. O próprio consumo de shoyu, que é fermentado de soja que os chineses utilizam em substituição ao sal, é muito alto. Sabem qual é a proteína mais consumida no mundo? Peixe. A gente não consegue vislumbrar isso. A gente esquece que países da Ásia consomem muito peixe. A gente não está acostumado. A gente vem de uma cultura em ascensão dentro do Brasil de acesso a peixe. Antes o peixe era comida de rico. Só o rico tinha acesso. Hoje não. Hoje temos cooperativas expandindo as suas produções. E a produção aumentando a gente dá acesso às pessoas. A gente não pode segregar a pessoa a ter direito a comer algo que só o rico pode. Esse não é o nosso papel. O Brasil vem fazendo essa transformação, essa revolução na agricultura que é algo que leva acesso a pessoas e oportunidades. Esse é um fator importante.

 

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