Conheça as obras restauradas que foram entregues nesta quarta, após serem quebradas em 8 de janeiro de 2023
Durante a cerimônia em defesa da democracia realizada no Palácio do Planalto, o ex-ministro do STF e atual ministro da Justiça e da Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, afirmou que a democracia é a concretização dos direitos fundamentais do ser humano.
Por Humberto Azevedo
O ato realizado na manhã desta quarta-feira, 8 de janeiro, no Palácio do Planalto e na Praça dos Três Poderes intitulado em defesa da democracia foi marcado pela entrega de 21 obras do patrimônio cultural brasleiro, entre pinturas, esculturas e um relógio do Século XVII, que haviam sido destruídas quando milhares de extremistas invadiram as sedes dos Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo com o objetivo de tentar a realização de um Golpe de Estado e abolir o Estado Democrático de Direito.
Decorridos dois anos da destruição, as obras foram restauradas. No primeiro momento da cerimônia, realizada na sala de audiências do Palácio do Planalto, aconteceu a reintegração de obras de arte, incluindo o relógio do século XVII consertado na Suíça sem custo para o governo brasileiro.
No segundo momento, foi feito o descerramento da obra “As Mulatas”, do artista Di Cavalcanti. Na sequência, foi realizada uma cerimônia de discursos no salão nobre do Palácio do Planalto. E, por fim, aconteceu um abraço da democracia, na Praça dos Três Poderes, quando o presidente acompanhado das demais autoridades desceram a rampa do Palácio do Planalto e encontraram o público presente para que fosse feito um abraço simbólico em defesa da democracia.
COOPERAÇÃO
A restauração de 20 das obras foi viabilizada por meio de acordo de cooperação técnica, entre a diretoria curatorial dos palácios presidenciais e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), que estabeleceu parceria com a Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). A restauração teve início em 2 de janeiro de 2024, com a montagem de um laboratório de restauração do Palácio da Alvorada, em espaço cedido pelo governo federal.
Cerca de 50 profissionais estiveram diretamente envolvidos no projeto, incluindo 12 professores da UFPel e dois da UnB, quatro técnicos, 14 alunos de graduação da UFPel e três da UnB, além de cinco conservadores-restauradores especializados, com a colaboração de profissionais da área de fotografia e audiovisual. Foram mais de 1.760 horas trabalhadas no laboratório, e as atividades de restauro contaram com a produção de 20 relatórios técnicos detalhando o processo de recuperação de cada obra.
DEMOCRACIA & DIREITOS HUMANOS
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), declarou durante a cerimônia que a democracia é a concretização dos direitos fundamentais do ser humano.
“Esse conceito evoluiu, mas sempre manteve a essência: a participação ativa do povo na gestão da coisa pública. Cada ameaça contra o regime democrático deve ser um lembrete do valor inestimável do que ele representa e da importância da luta cotidiana de todos nós para a sua preservação”, disse.
Dois anos após os atos antidemocráticos, o Ministério Público Federal (MPF) já denunciou 1.682 pessoas envolvidas na invasão e depredação das sedes dos Três Poderes. Desse total, 371 réus já foram condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Outros 535 denunciados por crimes de menor gravidade assinaram acordo com o MPF, validado pela Justiça, para encerrar a ação penal sem condenação em troca do cumprimento de medidas alternativas.
DI CAVALCANTI
Na visão da professora da UFPEL, Andréa Bachettini, coordenadora do projeto de restauração, um dos trabalhos mais simbólicos foi o quadro “Mulatas”, de Emiliano Di Cavalcanti, que durante os ataques sofreu sete punhaladas. A obra é a maior do acervo da Presidência e tem valor inestimável.
“Após a restauração, os danos ficaram imperceptíveis pela parte da frente, mas pelo verso a gente consegue ver as ‘cicatrizes’, as marcas dos rasgos. A gente não podia esconder”, afirmou.
ÂNFORA
Outra obra devolvida ao acervo é uma ânfora (vaso antigo) italiana em cerâmica esmaltada, que estava com 180 fragmentos catalogados após os ataques.
“Foi muito desafiador, um verdadeiro quebra-cabeça. Nossa restauradora Keli Scolari, especialista em cerâmica, fez esse trabalho de reintegração que deixou o resultado imperceptível, mesmo com as marcas de restauração. Tivemos que usar muitas técnicas, moldes, porque uma das alças tinha só um pedaço. Foi preciso fazer moldes com silicone para reprodução. A gente também fez modulação no computador para ver como ia ficar, então teve uso tecnológico para ver como as obras seriam após a restauração”, relatou a coordenadora. “Para nós foi muito importante fazer parte dessa história e agora devolver à população, ao povo brasileiro, essas obras que são super representativas da nossa cultura, da nossa arte, da história da arte brasileira e da nossa democracia”, disse.
RÉPLICAS
Após o descerramento do quadro de Di Cavalcanti, cinco alunos de um projeto de Educação Patrimonial entregarão ao presidente Lula réplicas que produziram da ânfora e de As Mulatas.
“Para mim, essa é a parte que mais tem a ver sobre o futuro, porque vem com esse trabalho que a gente semeou, desse afeto, desse sentimento de pertencimento, de respeito pelo patrimônio”, contou o presidente do IPHAN, ao revelar que as réplicas foram feitas durante atividades escolares pautadas no 8 de janeiro.
RELÓGIO
Para restaurar o relógio de mesa histórico fabricado por Balthazar Martinot e André Boulle no século XVII, que pertenceu a Dom João VI, e é uma das obras mais antigas que compõem o acervo da Presidência da República, foi realizado um Acordo de Cooperação Técnica com a Embaixada da Suíça.
Por meio do Embaixador Pietro Lazzeri, o país europeu manifestou disposição em colaborar com o restauro dias após as invasões. A tradicional empresa familiar suíça de relojoaria Audemars Piguet, criada em 1.875, ofereceu-se para o restauro, arcou com custos técnicos (mão de obra e materiais), bem como transporte e seguro. Portanto, não houve gastos públicos.
DOZE MESES
O acordo permitiu que, em menos de 12 meses, os pedaços do artefato fossem enviados à Suíça e o relógio voltasse ao Brasil restaurado, após mais de mil horas de trabalho. O Palácio do Planalto recebeu a obra de volta oficialmente nesta terça, 7 de janeiro.
“No contexto das amizades históricas entre os nossos países, isso para nós foi um passo adicional e coerente. Um dos principais desafios foi a dificuldade em reproduzir a cor original do gesso sobre as partes de ‘tartaruga’. Outro foi a confecção dos vidros laterais, que são curvos, e todo o trabalho de endireitamento dos bronzes que tinham sido deformados”, relatou o embaixador da Suíça no Brasil, Pietro Lazzeri.
EXPERTISE
O país, conhecido pela expertise em relojoaria, usou também um martelo de pele de porco para conservar o dourado original do relógio durante o restauro. “O objetivo foi trazer o objeto o mais próximo possível do original”, explicou o embaixador.
“Estamos orgulhosos por ter contribuído para restaurar esse patrimônio para o povo brasileiro. Nas nossas relações internacionais, a Suíça sempre tem como prioridade a promoção da democracia, dos direitos humanos e da prosperidade comum. A promoção da democracia faz parte dos eixos estratégicos da nossa estratégia de política exterior”, disse o embaixador.
Lista de obras restauradas que serão devolvidas ao acervo da Presidência: Relógio de mesa, de Balthazar Martinot e André Boulle; Ânfora italiana em cerâmica esmaltada; Escultura O Flautista, de Bruno Giorgi; Escultura Vênus Apocalíptica Fragmentando-se, de Marta Minujín; Quadro com a pintura Mulatas, de Emiliano Di Cavalcanti; Quadro com pintura do retrato de Duque de Caxias, de Oswaldo Teixeira; Quadro representando galhos e sombras, de Frans Krajcberg; Quadro com a pintura Fachada Colonial Rosa com Toalha; Quadro com a pintura Casarios, de Dario Mecatti; Quadro com a pintura Cena de Café, de Clóvis Graciano; Quadro com a pintura Paisagem, de Armando Viana; 5 Pintura de Glênio Bianchetti; » Quadro com a pintura Matriz e Grade no primeiro plano, de Ivan Marquetti; Quadro Rosas e Brancos Suspensos, de José Paulo Moreira da Fonseca; Tela Cotstwold Town, de John Piper; Tela de Grauben do Monte Lima; e Tela Bird, de Martin .Bradley