PMDF: 200 candidatos denunciam eliminação em análise de vida pregressa

Candidatos foram eliminados na fase de investigação social com base em boletins de ocorrência e processos arquivados sem trânsito em julgado

Por Metrópoles

Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) emitiu um ofício direcionado à Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) e ao Instituto Assessoria e Organização de Concursos Públicos (Instituto AOCP) para que esclareçam o contexto de eliminação de um grupo de mais de 200 candidatos na fase de sindicância de vida pregressa e investigação social do certame.

Segundo os candidatos, vários deles foram eliminados na fase de investigação social com base em boletins de ocorrência e processos arquivados sem trânsito em julgado, ou seja, quando não houve decisão final da Justiça no caso.

Tal critério de eliminação, no entanto, estaria em discordância com o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) sobre o tema, que considera ilegal a eliminação de candidato de concurso público em fase de investigação social ou sindicância de vida pregressa com base em investigações ou ações penais sem trânsito em julgado.

O ofício, publicado em 29 de maio, foi expedido pelo promotor de Justiça Fabiano Mendes Rocha Pelloso, após os candidatos procurarem a ouvidoria do MPDFT para denunciar o motivo das eliminações.

Segundo o representante da Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social (Prodep), ao observar os itens do edital do certame quanto à vida pregressa, referidas disposições permitem a eliminação de candidatos que tenham sido investigados pela prática de crimes, contravenções e atos infracionais ou que tenham figurado em ação penal sem o trânsito em julgado.

“Objetivando o esclarecimento dos fatos, determino a expedição de ofícios à PMDF – Polícia Militar do Distrito Federal e ao Instituto Assessoria e Organização de Concursos Públicos (Instituto AOCP) para que, no prazo de 10 dias, esclareçam sobre as alegações relatadas pelos candidatos”, diz a determinação do promotor.

Por meio de nota, o MPDFT informou que a Prodep requisitou informações à PMDF e aguarda os esclarecimentos para avaliar que medidas devem ser tomadas.

O que consta no edital

O item 16.18 sobre sindicância de vida pregressa e investigação social, que consta no edital nº 04/2023-DGP/PMDF, de 23 de janeiro de 2023, estabelece que seria passível de eliminação do concurso público, sem prejuízo das sanções penais cabíveis, o candidato que tivesse sua conduta tipificada em quaisquer dos fatos previstos nos itens 16.19, após análise de sua defesa.

  • Ser possuidor de registro policial nas condições de averiguado, autor ou indiciado, desabonador à conduta ilibada, à reputação e à idoneidade moral;
  •  Ter-se envolvido com a prática de contravenção penal;
  • Ter sido autor de ato infracional desabonador à conduta ilibada, à reputação e à idoneidade moral;
  •  Ter sido autor de infração penal de menor potencial ofensivo, nos termos do artigo 61 da Lei nº 9.099/95, desabonador à conduta ilibada, à reputação e à idoneidade moral.

Ainda, de acordo com o item 16.20, a existência de investigação, ação ou condenação penal, não definitiva, também poderia ser considerada em conjunto com outros fatos relevantes para a apuração da idoneidade do candidato.

Candidatos eliminados

Durante a etapa de investigação social, foi disponibilizado um link para que os candidatos preenchessem os formulários com suas informações confidenciais. Em uma das páginas, era necessário preencher se o candidato tinha algum tipo de boletim de ocorrência, processos ou alguma pendência na Justiça.

Fernando*, 24 anos, morador do Distrito Federal prestou o concurso para o cargo de soldado. Ele conta que conseguiu aprovação nas provas objetiva e discursiva, no Teste de Aptidão Física e psicotécnico. Porém, acabou eliminado na fase de investigação social.

“Nesse espaço, foi possível escrever pouquíssimos caracteres para descrever a situação do boletim de ocorrência, principalmente para os casos mais complexos. Descrevi toda a minha situação de uma forma bem resumida, porque foi o que coube, e aguardei o resultado. No dia 20/5, foi publicado o resultado preliminar no Diário Oficial e não constava meu nome, então logo pensei na ocorrência que havia descrito, o que foi confirmado como motivo de eliminação”, conta o jovem.

O candidato relata que a ocorrência em questão teria ocorrido em 2015, quando ele ainda era adolescente. “Foi gerado um processo na Vara da Infância e da Juventude, mas nunca fui citado, intimado e nem convocado. O processo foi arquivado. Só que o que me deixou intrigado foi ter sido eliminado por algo que o STF já definiu que não poderia gerar eliminação em investigação social”, argumenta.

Ele conta que entrou com recurso contra a eliminação e espera que a situação seja reavaliada. “É uma sensação de tristeza enorme, pois toda a esperança dos meus pais estava em mim nesse concurso. Demorei dias para avisá-los da eliminação”, lamenta Fernando*

Mariana*, 26 anos, é outra candidata do concurso que foi eliminada por envolvimento em boletim de ocorrência. A moradora do Piauí veio para Brasília apenas para participar do concurso. “No meu caso, havia registrado um boletim de ocorrência após me envolver em um acidente de trânsito e baterem no meu carro, em 2020. A ocorrência nem gerou inquérito policial, mas fui eliminada”, conta.

Jorge* também foi um dos candidatos eliminados por conta de registro de ocorrência e entrou com recurso contra o resultado. “No meu caso foi por conta de uma ocorrência de ameaça, registrada contra mim em 2022, só que o boletim nunca foi pra frente, tanto que nunca fui chamado a depor. Expliquei tudo isso na minha ficha e, para minha surpresa, fui eliminado”, diz.

O que dizem os envolvidos

Por meio de nota, o Instituto AOCP informou que a fase em questão é de exclusiva responsabilidade da PMDF. “Na realização dessa etapa, não há envolvimento da organizadora”, esclareceu a banca.

Questionada sobre os critérios de avaliação e eliminação da fase de sindicância da vida pregressa e investigação social, a PMDF disse que não se manifesta sobre decisões judiciais ou questões que envolvam a constitucionalidade delas. “Atribuição de avaliar a constitucionalidade das disposições e procedimentos cabe exclusivamente ao Judiciário”, destacou a corporação.

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