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Paulo Paim durante análise do projeto reconhecendo o estado de calamidade pública no Rio Grande do Sul. (Foto: Alessandro Dantas)

Câmara aprova suspensão da dívida do Rio Grande do Sul por três anos; Matéria é enviada ao Senado onde já tem relator

Proposta do governo Lula em análise pelo Congresso Nacional suspende pagamento da dívida do Rio Grande do Sul com a União pelos próximos 36 meses; estoque da dívida gaúcha com o governo federal que se encontra em algo de R$ 100 bilhões, com a suspensão, o estado poderá direcionar cerca de R$ 23 bi para as ações de reconstrução, visto que R$ 12 bi da cobrança de juros das parcelas dos próximos três anos foram perdoados. Medidas não são restritas ao caso gaúcho e, sim, para quaisquer outros casos semelhantes que vierem a ser enfrentados por estados e municípios.

 

Por Humberto Azevedo

 

A Câmara dos Deputados aprovou já na madrugada desta quarta-feira, 15 de maio, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 85/24, que suspende os pagamentos das próximas 36 parcelas mensais da dívida do Rio Grande do Sul (RS) com a União com o objetivo para que o dinheiro seja aplicado nas ações de enfrentamento da situação de calamidade pública provocada pelas fortes chuvas que castigam o estado e já afetou mais de dois milhões de pessoas, matando 146. Com a matéria já enviada ao Senado, o senador Paulo Paim (PT-RS) foi indicado relator da iniciativa naquela “Casa da Federação”.

 

De autoria do Poder Executivo, o PLP 85/24 foi relatado na Câmara pelo deputado Afonso Motta (PDT-RS), que fez pequenos ajustes na redação original. Embora o texto tenha surgido para esta situação específica das enchentes, a mudança beneficiará qualquer outra unidade federativa que enfrente algum caso assemelhado de calamidade pública como o enfrentado pelos gaúchos. A ideia é permitir que a legislação já fique adequada a futuras ocorrências causadas pelas mudanças no clima decorrente das ações humanas ao longo dos últimos dois séculos, de maneira profunda, junto à natureza.

 

Afonso Motta defendeu a suspensão da dívida do governo gaúcho. Segundo ele, “a tragédia incalculável que se abateu sobre o RS prova sem sombra de dúvida que é necessário haver um dispositivo legal autorizando o governo federal a refinanciar as dívidas dos estados eventualmente atingidos por calamidades públicas”, comentou, ao ressaltar que a proposta não é restrita ao caso gaúcho, mas a todo estado e municípios com calamidade pública decretada.

 

O deputado Jilmar Tatto (PT-SP) lembrou que a proposta não privilegia apenas um estado, porque a autorização será válida para todos estados e municípios em casos de calamidade pública. “É uma medida responsável e não existe privilégio a um estado apenas”, completou o petista paulista.

 

Ao receber a informação de que relataria a proposição no Senado, o senador Paulo Paim destacou a importância de os senadores aprovarem ainda nesta quarta o projeto. “Fui designado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), relator do projeto do governo federal que suspende a dívida do RS com a União por três anos. O texto foi aprovado na Câmara com a relatoria do deputado Afonso Motta. O Senado precisa aprová-lo hoje mesmo, com urgência. Nosso objetivo é salvar vidas, reconstruir hospitais, escolas, estradas, cidades”.

 

ESTOQUE DA DÍVIDA

 

O estoque da dívida gaúcha com o governo federal é algo próximo a R$ 100 bilhões. Com a suspensão dos pagamentos pelos próximos três anos, o estado poderá direcionar cerca de R$ 23 bi para as ações de reconstrução, visto que R$ 12 bi da cobrança de juros das parcelas dos próximos 36 meses foram perdoados. 

 

No entanto, há que se observar a possibilidade de queda da arrecadação do estado devido à situação persistente de paralisia da atividade industrial e comercial em várias áreas do estado. É essa receita de arrecadação que normalmente o RS usa para pagar as parcelas da dívida com a União.

 

Em 2023, o superávit orçamentário do estado foi de R$ 3,6 bilhões, semelhante ao de 2022 (R$ 3,3 bilhões). Segundo dados do portal Tesouro Nacional Transparente, entre 2021 e 2023, a União repassou ao RS, por força de dispositivos constitucionais ou legais cerca de R$ 8,8 bilhões, ligados, por exemplo, a royalties (recursos minerais e hídricos), parcela referente a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) combustíveis, além de repasses do Fundo de Participação dos Estados (FPE), restituições da Lei Kandir e outras receitas não vinculadas a uma finalidade específica, como o  Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).

 

Essas receitas adicionadas a adesão do estado ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) em 2022 ajudaram a equilibrar suas contas.

 

REGRAS

O PLP 85/24 prevê, para esse caso e para outros vindouros, a suspensão do pagamento das parcelas por até 36 meses em calamidades provocadas por eventos climáticos extremos.

 

Durante o período a ser fixado em decreto, a dívida não sofrerá incidência de juros do refinanciamento fixado em 4% ao ano pela Lei Complementar 148/17, valendo inclusive se o estado estiver no RRF, que tem condições especiais. Por outro lado, o montante que deixou de ser pago continuará a ser atualizado monetariamente pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

 

Essa lei complementar prevê a correção total das dívidas com a União pelo menor de dois índices: IPCA mais 4% ao ano (juros) ou variação da taxa Selic, comparados mensalmente. Como o projeto suspende o pagamento das parcelas e isenta esses valores da incidência de juros de 4%, a correção pelo IPCA não estará mais limitada à Selic durante esse período.

 

Todos os valores cujos pagamentos foram suspensos serão contabilizados à parte e incorporados ao saldo devedor depois do fim da suspensão, sem extensão do prazo total de refinanciamento. Haverá atualização pelos encargos financeiros contratuais normais, trocando-se os juros do período pela taxa zero.

 

TERMO ADITIVO

 

Todas as condições especiais em função de calamidade por eventos climáticos extremos deverão ser pactuadas em termo aditivo a ser assinado em até 180 dias após o encerramento da vigência do estado de calamidade pública.

 

Caso o termo aditivo não seja celebrado nesse prazo, as dívidas com pagamento suspenso serão recalculadas com os encargos contratuais normais, as taxas de juros originais dos contratos ou as condições financeiras aplicadas em função do regime de recuperação fiscal.

 

PLANO DE ENFRENTAMENTO

 

Os valores das parcelas com pagamento suspenso, corrigidos com base nas taxas de juros originais dos contratos ou segundo as condições do RRF, deverão ser direcionados a um fundo público específico a ser criado pelo ente federativo beneficiado. Assim, os juros não contam para a retomada do pagamento suspenso, mas devem entrar no montante a ser aplicado nas ações de reconstrução.

 

Esse dinheiro do fundo deverá ser direcionado integralmente a um plano de investimentos em ações de enfrentamento e mitigação dos danos decorrentes da calamidade pública e de suas consequências sociais e econômicas.

 

O ente federativo beneficiado terá 60 dias, contados do reconhecimento do estado de calamidade pública, para encaminhar ao Ministério da Fazenda o plano de investimentos com os projetos e as ações a serem executados com os recursos de dívidas suspensas, inclusive as operações de crédito que pretende contratar.

 

Caso o ente federativo não use os valores suspensos do serviço da dívida nas ações propostas, a diferença entre o que deveria ser utilizado e o que foi efetivamente gasto deverá ser aplicada em ações a serem definidas em ato do Executivo federal.

 

Outra exceção prevista no texto permite ao governador ou prefeito beneficiado com a suspensão enviar relatório específico ao Ministério da Fazenda pedindo autorização excepcional para criar ou aumentar despesas correntes ou renúncias de receitas que não estejam relacionadas ao enfrentamento da calamidade pública.

 

Sem IPCA

 

No âmbito do regime de recuperação fiscal, do qual o Rio Grande do Sul faz parte, todas as despesas primárias (exclui despesas com juros) devem ser limitadas ano a ano à variação do IPCA.

 

Para o caso específico das despesas bancadas com as parcelas suspensas da dívida junto à União e das despesas bancadas com empréstimos, o texto dispensa esse limite porque os recursos serão utilizados em ações de enfrentamento dos danos.

 

De igual forma, os participantes do RRF não precisarão incluir as despesas bancadas com o dinheiro reservado da suspensão da dívida nas metas e compromissos fiscais assumidos com o governo federal para aderir à recuperação fiscal.

 

OPERAÇÕES DE CRÉDITO

 

Quanto aos empréstimos (operações de crédito), a mudança na Lei Complementar 159/17 não faz referência à calamidade pública provocada por eventos climáticos extremos para permitir aos participantes do RRF contraírem empréstimos enquanto estiverem nesse regime, fazendo referência apenas à calamidade pública reconhecida pelo Congresso Nacional por meio de proposta do Executivo federal.

 

As despesas devem ser usadas em ações de enfrentamento e mitigação dos danos decorrentes de calamidade pública e de suas consequências sociais e econômicas, mas poderiam, assim, referir-se a qualquer situação de calamidade, como uma nova pandemia, por exemplo.

 

RESPONSABILIDADE FISCAL

 

Já na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), outra mudança é mais abrangente. Atualmente, essa lei proíbe um ente da Federação de realizar empréstimos junto a bancos de outro ente se for para financiar, direta ou indiretamente, despesas correntes (funcionalismo, água, luz, serviços).

 

Com a mudança proposta, poderão ser financiadas despesas correntes se for para estruturar projetos ou para garantir contraprestações em contratos de parceria público-privada ou de concessão. No entanto, valerá não somente para situações de calamidade pública.

 

Certas modelagens de parcerias público-privadas preveem, por exemplo, o pagamento de uma contraprestação pelo poder público em troca do investimento do parceiro privado, o que caracteriza uma despesa corrente. E isso poderá ser custeado com empréstimos de bancos estatais.

 

PUBLICIDADE E RELATÓRIOS

 

Quanto aos mecanismos de publicidade e transparência no gasto dos recursos liberados com a suspensão da dívida, o ente federativo beneficiado deverá demonstrar como foram aplicados, correlacionando as ações desenvolvidas e os recursos não pagos à União, sem prejuízo da supervisão dos órgãos de controle competentes. Após 90 dias do encerramento de cada exercício, deverá enviar relatório de comprovação de aplicação dos recursos.

 

AÇÕES JUDICIAIS

 

O PLP 85/24 impõe como condição para a assinatura do termo aditivo a suspensão, por parte do ente beneficiado, de qualquer ação judicial existente e o compromisso de não propor ações questionando as dívidas ou contratos ou mesmo a execução de garantias ou contra-garantias da União contra o ente pela falta de pagamentos.

 

Isso valerá enquanto durar a suspensão das parcelas da dívida e no que for relacionado ao decreto legislativo de reconhecimento de calamidade.

 

Com informações de assessorias e da Agência Câmara.

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