CCJ envia ao plenário do Senado projeto que recria seguro-obrigatório
Proposta, de autoria do Poder Executivo e relatada pelo líder do governo no Senado – Jaques Wagner, libera R$ 15,7 bi para a União, que representa 0,8% do valor a ser arrecadado, que poderá ser usada para compensar o corte de emendas parlamentares.
Por Humberto Azevedo, com informações da Agência Senado.
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal aprovou nesta última terça-feira (7) a recriação seguro obrigatório, com um novo formato, para veículos, semelhante ao antigo Danos Pessoais por Veículos Automotores Terrestres (DPVAT).
O texto do Projeto de Lei Complementar (PLP) 233/23, de autoria do Poder Executivo, também aumenta e libera em R$ 15,7 bilhões o limite da União para fazer frente às despesas que por ventura venham ser contingenciadas (cortadas) referentes as emendas individuais apresentadas por parlamentares. Depois de receber 15 votos a favor e 11 contrários, a matéria seguirá para a pauta do plenário daquela Casa legislativa. A votação deverá acontecer nesta quarta-feira (8).
Relator da iniciativa na CCJ, o senador Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo na Casa, apresentou relatório favorável ao PLP 233/23, chamando a atenção para o “caráter solidário” do novo seguro “para quem não tem seguro contratado”. Aprovado em abril na Câmara dos Deputados, o texto cria o Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT). De acordo com a proposição, o SPVAT deve ser cobrado dos proprietários de automóveis e usado para pagar indenizações por acidentes.
“A recriação do DPVAT não tem nenhum condão, do ponto de vista do governo, de fazer caixa. O valor será de R$ 50 a R$ 60 para todos (donos de carros ou motos). Reparem que, quando estava na holding das quatro grandes seguradoras que tomavam conta do DPVAT até declinarem, o valor era superior a R$ 100, R$ 200 para motos. Portanto, havia uma gordura absurda”, explicou Jaques Wagner aos colegas da CCJ.
MUDANÇAS
A Câmara dos Deputados alterou o texto original proposto pelo Poder Executivo para ampliar a lista de despesas a serem cobertas pelo SPVAT. O rol passa a contemplar assistência médica e suplementar, como fisioterapia, medicamentos, equipamentos ortopédicos, órteses e próteses. Alteração mantida no texto aprovado na CCJ do Senado.
Também passam a ser pagos pela nova tarifa serviços funerários e despesas com a reabilitação profissional de vítimas que ficarem parcialmente inválidas. Outra alteração feita pelos deputados e mantidas, até agora, pelo Senado, é a possibilidade para que pedidos de indenização e assinatura de documentos possam ser feitos por meio cibernético e eletrônico.
EMENDAS PARLAMENTARES
Das 27 emendas apresentadas ao PLP 233/23 na CCJ, o senador Jaques Wagner acatou apenas uma delas, de redação, apresentada pelos senadores Marcos do Val (Podemos-ES) e Rogério Carvalho (PT-SE).
Nesta alteração, a proposição deixa claro que o cônjuge e os herdeiros da vítima devem receber indenização por morte e reembolso de despesas com serviços funerários. A vítima recebe as demais coberturas: invalidez permanente e reembolso por despesas com fisioterapia, medicamentos, equipamentos ortopédicos, órteses, próteses e reabilitação profissional.
Os senadores Alan Rick (União-AC), Carlos Portinho (PL-RJ) e Vanderlan Cardoso (PSD-GO) apresentaram emendas para tirar do projeto o dispositivo que cria uma multa de trânsito por atraso no pagamento do SPVAT, incluído pelos deputados federais. Segundo o relator, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá vetar esse ponto do texto.
“Não estou acolhendo, mas quero me comprometer com o veto do Poder Executivo neste artigo. Esse item, uma penalização excessiva, veio da Câmara, mas será vetado pelo presidente da República”, informou Jaques Wagner.
DEBATES
A oposição criticou a criação do SPVAT. Para o senador Carlos Portinho, líder do PL, a criação do SPVAT vai elevar a carga tributária:
“O [novoseguro] tem natureza arrecadatória. O beneficiário é o Estado. É tudo para sustentar a máquina do Estado. O contribuinte já compra o carro mais caro do mundo, cheio de imposto pendurado. Ele paga o IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores), e não sabe para onde vai o dinheiro. Paga o licenciamento. Paga um dos combustíveis mais caros do mundo. Paga um seguro privado. E agora a gente vai enfiar na população mais uma contribuição, taxa, imposto? A gente não, que eu voto contra. A tunga é no bolso do trabalhador”, comentou o parlamentar do PL fluminense – mesmo partido do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O senador Carlos Viana (Podemos-MG) apresentou uma emenda para isentar da cobrança do SPVAT os donos de veículos que tenham apólices privadas de seguro. Mas o senador Jaques Wagner não acolheu a sugestão.
“Por que não podemos manter o seguro apenas para quem não tem uma apólice? Se já pago um seguro, porque vou ser obrigado a pagar o SPVAT? Por que temos que impor isso a toda a sociedade brasileira? Isso só vai impondo a todos nós uma vida muito mais difícil. O seguro é importante? Ao meu ver, é. Mas não acho justo que imponhamos ao cidadão brasileiro, que já tem uma carga muito grande no seu salário”, questionou Viana.
Já o senador Fabiano Contarato (PT-ES) defendeu a aprovação da matéria: “Vejo os colegas senadores falarem em imposto, em tributo. Com todo respeito, eles não estão sabendo diferenciar o que é um tributo do que é um seguro. O seguro é um contrato, que gira em torno de risco. É pago apenas por quem é proprietário de veículo automotor, enquanto qualquer pessoa pode ser seu beneficiário. Daí a função de proteção social. Se uma pessoa é atropelada e você não sabe quem é o motorista, impõe-se o recebimento do seguro. Não tem nada a ver com tributo, não tem nada a ver com imposto”.
Na opinião do senador Weverton (PDT-MA), o seguro obrigatório é uma forma de proteger as vítimas de acidentes de trânsito: “Temos no Brasil mais de 620 mil acidentes por ano, e cerca de 30 mil pessoas perdem a vida. Matamos tanto quanto uma guerra nesse dia a dia muito difícil que vivemos, que é o trânsito brasileiro”.
ARCABOUÇO FISCAL
Além de criar o SPVAT, o PLP 233/23 altera o novo arcabouço fiscal (Lei Complementar 200, de 2023). O texto antecipa em dois meses a permissão para a abertura de crédito suplementar em caso de superávit fiscal. Segundo Jaques Wagner, a mudança permitiria uma elevação de 0,8% nas despesas da União, o equivalente a R$ 15,7 bilhões.
Parte do dinheiro poderá ser usada para compensar o corte de emendas parlamentares ao Orçamento (Lei 14.822, de 2024). Na mensagem de veto parcial ao texto (VET 4/2024), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva suspendeu uma dotação de R$ 5,6 bilhões prevista para o pagamento de despesas sugeridas por comissões permanentes do Senado, da Câmara e do Congresso Nacional.
Segundo o líder do governo, caso a antecipação para a abertura de crédito suplementar prevista no PLP 233/23 seja aprovada pelo plenário do Senado, R$ 3,6 bilhões serão usados para compensar o corte de emendas imposto pelo veto 4/24. O veto ao Orçamento está na pauta de uma sessão deliberativa conjunta da Câmara e do Senado, marcada para a próxima quinta-feira (9).
A oposição criticou a mudança no arcabouço fiscal. No entender do senador Carlos Portinho, a antecipação da abertura de crédito suplementar é “um jabuti” — tema estranho ao objeto de uma proposição legislativa — incluído no texto original pelos deputados federais.
“Esse precedente é muito grave. Não dá para admitir mais jabuti ou vai virar regra. Não tem nada a ver com o mérito. Se passar esse, vão passar todos. Não vai ter mais argumentos para segurar a manada de jabutis que vão vir em outros projetos de lei. Isso é uma vergonha”, protestou o senador bolsonarista.
A bancada do PL apresentou um destaque para retirar o dispositivo do texto. Mas a emenda foi rejeitada pela CCJ em votação simbólica.