• Home
  • Geral
  • Cientistas encontram forma de saber que vacina promoveu imunidade duradoura

Cientistas encontram forma de saber que vacina promoveu imunidade duradoura

Plaquetas podem funcionar como marcadores de uma resposta imune longa e persistente das vacinas, e que pode ser potencializada por hormônio produzido no fígado e rins

As plaquetas, fragmentos de células que atuam na coagulação do sangue, podem estar associadas a uma resposta imune longa e persistente das vacinas, revela estudo internacional com participação brasileira. Através de análises de expressão genética (transcritoma), experimentos com animais e culturas de células, os pesquisadores apontam que a resposta imune pode ser potencializada pelo hormônio TPO, produzido pelo fígado e pelos rins, que ativa a síntese de plaquetas, combinada com a ação das células B, produtoras de anticorpos.

Os resultados da pesquisa estão em artigo publicado no site Nature Immunology. “Esse trabalho começou com a proposta de fazer vacinologia de sistemas, tentando desvendar o mecanismo molecular da imunidade que era induzida pela vacina contra H5N1”, afirma ao Jornal da USP Helder Nakaya, professor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da USP e pesquisador no Hospital Israelita Albert Einstein, um dos autores do artigo. “Para compreender esse mecanismo, a vacinologia de sistemas tem que combinar tecnologias ômicas e dados imunológicos”.

As tecnologias ômicas são empregadas para entender o funcionamento das moléculas existentes nos organismos vivos. Entre elas estão a genômica, que estuda o conjunto dos genes (genoma), a transcriptômica (que pesquisa a expressão dos genes), a proteômica (análise de proteínas) e a metabolômica (que investiga os metabólitos, produtos do metabolismo celular).

foto de um homem oriental, cabelos pretos curtos e olhos pretos. Ele está falando ao microfone e, ao fundo, existe uma parede com espumas anti-ruído.

Helder Nakaya – Foto: Gabriel Soares

Nakaya relata que o objetivo inicial da pesquisa era entender o efeito adjuvante, ou seja, de que forma a resposta imunológica da vacina era potencializada. “Para saber os fatores que influenciaram essa resposta e sua duração, nós analisamos os níveis de células B [produtoras de anticorpos], afinidade aos anticorpos e dados de transcriptoma das células [que analisa a expressão dos genes da célula]”, relata o professor.

a imagem é uma representação da análise transcritoma. Do lado esquerdo, as linhas traçadas formam um braço, com a representação de uma seringa sendo injetada. Do lado direito, uma imagem de osso dá destaque à medula osssea, em vermelho. Ao lado, um quadro mostra a ativação da resposta imune, em que células são representadas em vermelho

Análise da atividade de 20 mil genes, antes e depois da imunização, mostrou que vacina com resposta imune mais longa tem um marcador de plaquetas, que atuam na coagulação do sangue. Foto: Extraída do artigo

Resposta duradoura

“Também fizemos análise de citometria de fluxo [que avalia as concentrações celulares] e de células T foliculares, que ajudam as células B a produzir os anticorpos e que são o objetivo desta vacina”, conta Nakaya. “Nós estávamos analisando o transcriptoma, ou seja, a atividade de 20 mil genes ao mesmo tempo, antes e depois da vacinação, e notamos que uma das diferenças da vacina que induzia uma resposta longa, era uma assinatura de plaquetas [componentes do sangue que atuam na coagulação]”.

De acordo com Nakaya, quando eram aplicadas duas doses da vacina H5N1, gerava uma resposta imune alta, mas passageira. “Quando você incluía o adjuvante, a resposta não só era alta como duradoura”, aponta. “Observamos que os genes de plaquetas estavam associados a essa resposta longa, mas como plaquetas não possuem núcleo, sabíamos que não estávamos detectando mudanças de expressão dos genes dentro desses fragmentos de células”.

“As plaquetas são derivadas de células precursoras chamadas megacariócitos, que estão na medula óssea. Então, a hipótese era de que eles poderiam ter algum papel na resposta imunológica longa persistente de anticorpos”, observa o pesquisador. “Isso foi testado com o uso de trombopoetina (TPO), hormônio produzido no fígado e nos rins que ativa os megacariócitos a se diferenciarem em plaquetas”.

Na etapa seguinte da pesquisa, foram realizados experimentos em camundongos, vacinados com o antígeno do H5N1 e o adjuvante, com ou sem TPO. “O que queríamos saber era se TPO aumentaria a longevidade da resposta imune”, afirma Nakaya. “Foi visto que os camundongos que eram estimulados com TPO e a vacina tinham resposta mais alta e mais duradoura do que os animais que apenas recebiam a vacina”.

Efeito potencializador

O próximo passo dos cientistas foi comprovar o efeito do adjuvante por meio de co-culturas em laboratório, com células B isoladas e junto com os megacariócitos e a TPO, além de um arranjo onde a célula B e o megacariócito estavam separados por uma barreira física. “A ideia era mostrar se o contato era importante para gerar uma resposta de anticorpos duradoura”, descreve o pesquisador.

Havia uma dúvida sobre a resposta longa ter a ver com a Interleucina 6 (IL6) e APRIL, duas proteínas que podem ser produzidas pelos megacariócitos e que regulam a resposta imune. “Quando eram colocadas células B junto com megacariócitos ativados com TPO, a resposta imune aumentava bastante, só que se você separasse fisicamente, ela diminuía, mostrando que de fato você precisa do contato”, destaca Nakaya. “Ao serem introduzidos anticorpos anti-IL6 e anti-APRIL, essa resposta não é afetada, indicando que essa resposta não tinha a ver com essas proteínas”.

“Esse resultado foi validado em seres humanos pegando células da medula óssea, tanto células B quanto megacariócitos, mostrando que quando você adiciona TPO, os níveis de resposta também aumentam”, acrescenta o pesquisador. O artigo é resultado de mais de dez anos de pesquisas do grupo liderado pelo professor Bali Pulendran, da Universidade de Stanford (Estados Unidos), com o qual Nakaya tem colaborado desde o pós-doutorado, com estudos na FCF e no Hospital Israelita Albert Einstein.

  • Compartilhar:

PUBLICIDADE